sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Efeitos do tipo de lesão e casqueamento no comportamento de curto prazo de vacas leiteiras em pastejo

 

Escrito por: Aline Cardoso Vieiraa

                  Vivian Fischerb

a Doutoranda do Programa de Pós Graduação em Zootecnia da UFRGS.

b Professora Titular do Departamento de Zootecnia da UFRGS, Doutora em Zootecnia.

 

A claudicação é uma mudança na marcha dos animais, frequentemente relacionado à presença de lesões que levam à dor e / ou desconforto. Algumas condições, como alta produção de leite no início da lactação (Bicalho et al., 2008), baixo escore de condição corporal durante o período periparturiente (Hoedemaker et al., 2009), idade (Dippel et al., 2009) e meio ambiente, como o tipo de piso, a presença de sujeira e umidade (Cook e Nordlund, 2009) podem aumentar a ocorrência de claudicação no rebanho. Lesões nos membros podem resultar em redução na produção leite (Bicalho et al., 2008), na fertilidade e maior risco de abate prematuro (Bicalho et al., 2007).


                Fonte: Milkpoint, 2006

Com o objetivo de investigar como o tipo de lesão de casco, casqueamento corretivo e tratamento alteram o comportamento de vacas leiteiras com claudicação severa nos sistemas de pastejo foi conduzida uma pesquisa em um rebanho comercial de leite, no município de Eldorado do Sul, no Rio Grande do Sul.

Foram selecionadas 34 vacas lactantes, sendo 28 vacas Holandesas e 6 Jersey com idade média de 4,0, pesando em média 616kg de peso corporal, com 192 dias em lactação. Os animais selecionados pastavam em pastagem de Tifton (Cynodon spp.), em piquete de aproximadamente 1,6 ha, com mais de 2.500 kg de matéria seca de massa de pastejo e tinham livre acesso a água e sombra.

O escore de locomoção de todas as vacas foi avaliado dois dias antes do casqueamento e tratamento (dia -2). As pontuações do escore de locomoção foram atribuídas usando um sistema de classificação numérica de 1 a 5, em que 1 = marcha perfeita e 5 = severamente manco.

As observações comportamentais foram realizadas um dia antes do casqueamento e tratamento e 6 dias depois. Atividades de comportamentos posturais, como o tempo gasto em pé e deitado, deitado do lado direito, deitado do lado esquerdo e caminhar, bem como comportamentos ingestivos como ruminar, ocio (sem mastigar), comer no comedouro e pastar foram estimadas por observação visual de cada vaca em intervalos de 10 minutos. 



Vacas mancas (EL> 3) passam maior proporção de tempo deitadas, assim, com a menor proporção de tempo gasto em pé, tendem a mostrar menor proporção de tempo gasto se alimentando no cocho do que vacas não mancas (EL≤3). Não houve diferenças significativas entre vacas mancas e não mancas para proporções de tempo gasto caminhando, ruminando, pastando e ocio (Tabela 2).



Animais com doenças infecciosas (dermatite) apresentaram menor proporção de tempo gasto deitado, deitado do lado direito, e ocioso (sem mastigar), portanto, maior proporção de tempo gasto em pé do que animais com doenças não infecciosas (laminite). Vacas com doenças infecciosas tenderam a apresentar maior proporção de tempo se alimentando no cocho (Tabela 3).



Mensagem para levar para casa:

1.   O casqueamento e o tratamento melhoram o escore de locomoção da maioria das vacas;

2.   Mudanças no comportamento de curto prazo foram mais relacionadas à postura (deitado e em pé) do que ao comportamento ingestivo.

 

Artigo base

CRUZ, E. A.; FISCHER, V.; PASSOS, L. T.; PORCIUNCULA, G. C.; STUMPF, M. T.; WERNCKE, D. SANTOS, C. S. Effects of type of lesion and trimming on short-term behavior of grazing dairy cows. R. Bras. Zootec., v.46, n.4, p280-285, 2017

 

Demais referencias

 

Bicalho, R. C.; Vokey, F.; Erb, H. N. and Guard, C. L. 2007. Visual locomotion scoring in the first seventy days in milk: impact on pregnancy and survival. Journal of Dairy Science 90:4586-4591.

Bicalho, R. C.; Warnick, L. D. and Guard, C. L. 2008. Strategies to analyze milk losses caused by diseases with potential incidence throughout the lactation: a lameness example. Journal of Dairy Science 91:2653-2661.

Cook, N. B. and Nordlund, K. V. 2009. The influence of the environment on dairy cow behavior, claw health and herd lameness dynamics. The Veterinary Journal 179:360-369.

Dippel, S.; Dolezal, M.; Brenninkmeyer, C.; Brinkmann, J.; March, S.; Knierim, U. and Winckler, C. 2009. Risk factors for lameness in freestall-housed dairy cows across two breeds, farming systems, and countries. Journal of Dairy Science 92:5476-5486.

Hoedemaker, M.; Prange, D. and Gundelach, Y. 2009. Body condition change ante- and postpartum, health and reproductive performance in german holstein cows. Reproduction in Domestic Animals 44:167-173.

quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Diferentes níveis de energia fornecida para vacas em lactação afetam atributos físico-químicos do leite

Escrito por: Lisiane Garciaa

                  Vivian Fischerb

aAluna de mestrado do departamento de Pós Graduação em Zootecnia da UFRGS

bProfessora titular do Departamento de Zootecnia da UFRGS

 

A nutrição de vacas em lactação é um desafio para técnicos e produtores, tendo em vista que a categoria precisa ter suas exigências nutricionais atendidas para ter condições de lactar, ciclar para nova gestação, para a mantença e continuar se desenvolvendo, em caso de primíparas.  Há várias ferramentas que auxiliam o produtor a formular e balancear a dieta desses animais. As exigências energéticas podem ser expressos como a quantidade de nutrientes digestíveis totais (NDT), que ainda é amplamente utilizado, pois pode ser facilmente determinado por análise de alimentos (Weiss, 1998).

Níveis de energia distintos na dieta de vacas em lactação modificam os níveis de produção (Reid et al., 2015), composição química do leite (Sova et al., 2014), peso vivo e escore de condição corporal (Weber et al., 2015), entretanto não há muitos trabalhos que avaliem o efeito da redução dos níveis de energia da dieta de vacas em lactação na estabilidade do leite ao etanol. Então, com o objetivo de avaliar a mudança na produção e nas características físico-químicas do leite foram conduzidos 7 estudos, de 2004 e 2011, com parceria entre o grupo Pesquisa de gado leiteiro e comportamento animal (NUPLAC), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) e Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Foram avaliadas 132 vacas em diferentes estágios de lactação. Foram feitas 392 observações referentes aos diferentes níveis de consumo de energia por estes animais.

A Tabela 1 mostras informações sobre os sete diferentes testes de alimentação dados aos animais no período dos experimentos, a composição da dieta fornecida, a duração do experimento, o número e a raça dos animais utilizados, o peso vivo dos animais e a produção média diária de leite por vaca e o período de lactação.

Tabela 1: Características dos experimentos alimentares


Foram avaliadas as variáveis níveis de fornecimento de energia (% NDT da dieta), período de alimentação (número de dias), raça , produção diária de leite, gordura, proteína e teores de lactose, porcentagem de sólidos totais (ST), escore de células somáticas (SCS), acidez titulável e o teste de estabilidade ao etanol, tendo a maior concentração de etanol necessária para a coagulação da amostra de leite.

Não houve associação entre os componentes do leite com os níveis de energia, a porcentagem de etanol necessário para coagular o leite, o teor de lactose e a produção de leite.  Entretanto, os níveis de energia na dieta foram positivamente associados com produção de leite, estabilidade do leite e teor de lactose, como mostra a Figura 1.

Figura 1: Variáveis (nível de suplemento de energia, duração do experimento, produção de leite e características físico-químicas) projetadas no fator principal 1 e 2


As 392 observações foram agrupadas em 3 conjuntos de dados de acordo com a semelhança entre as observações. Os grupos  apresentavam 115, 135 e142 observações.  Esses 3 grupos são respectivamente referentes aos cluster 1, 2 e 3 da Figura 2.


Figura 2: Médias canônicas padronizadas de atributos produtivos e características físico-químicas do leite de vacas alimentadas com diferentes níveis de energia



Os fatores mais relevantes para agrupar as observações foram o nível de suprimento de energia, teor total de sólidos e acidez titulável de leite. Os atributos mais importantes que explicam a variação entre os grupos foram o nível de fornecimento energia, estabilidade do leite, produção de leite e contagem de células somáticas (SCS); gordura, lactose e teor total de sólidos; e duração dos ensaios, acidez e teor de proteínas para os clusters 1, 2 e3, respectivamente.  Isso se explica porque o aumento no suprimento de nutrientes via dieta resulta em maior disponibilidade de nutrientes para a glândula mamária, aumentando a produção leiteira (Lemosquet et al., 2009). De acordo com Giallongoet al. (2015), o aumento no suprimento de energia nem sempre afeta composição físico-química do leite, pois essa relação vai depender do nível de energia original, potencial produtivo da vaca, estágio de lactação e incremento líquido da energia fornecida (Benchaar et al., 2014; Boerman et al., 2015;Broderick et al., 2015).

A produção de leite diária aumentou com a suplementação de NDT. O leite apresentou maior estabilidade quando os níveis de NDT foram fornecidos em níveis médio e alto. Riuset al. (2010) relataram que um alto nível de energia suplementada como amido resulta em maior produção de leite e síntese proteica, atribuída ao aumento da secreção de insulina e fator de crescimento. Contudo, observou-se uma redução do teor de proteína do leite no grupo 3 mesmo com o maior aporte de NDT. Nesse caso,  pode ter havido o efeito de diluição da concentração de proteina devido ao aumento do volume de leite em 40%, bem como por uma proporção maior de vacas holandesas no grupo em comparação com a predominância de vacas Jersey dos grupos 1 e 2. O maior teor de gordura do leite observado no grupo 2 do que no grupo 3, pode ter resultado do maior uso de forragens, que por sua vez aumentou o teor de fibra da dieta.

O aumento do nível de energia fornecida às vacas leiteiras aumenta o volume de leite produzido, o teor de lactose e a estabilidade do leite no teste de etanol, mas não influencia outros compoenentes lácteos ou a saúde do úbere.

 

Artigo base

 

A.M. Gabbi; C.M. McManus; L.T. Marques; A.S. Abreu; S.C. Machado; M.B. Zanela; R.S. Barbosa and V. Fischer. (2018) Different levels of supplied energy for lactating cows affect physicochemical attributes of milk. Journal of Animal and Feed Sciences, 27, 11–17. DOI: https://doi.org/10.22358/jafs/83703/2018

 

Referências Bibliográficas

Benchaar C., McAllister T.A., Petit H.V., Chouinard P.Y., 2014. Whole flax seed and flax oil supplementation of dairy cows fed highforage or high-concentrate diets: Effects on digestion, ruminal fermentation characteristics, protozoal populations and milk fatty acid profile. Anim. Feed Sci. Technol. 198, 117–129, https://doi.org/10.1016/j.anifeedsci.2014.10.003

Boerman J.P., Potts S.B., VandeHaar M.J., Allen M.S., Lock A.L., 2015. Milk production responses to a change in dietary starch concentration vary by production level in dairy cattle. J. Dairy Sci. 98, 4698–4706, https://doi.org/10.3168/jds.2014-8999

Broderick G.A., Faciola A.P., Armentano L.E., 2015. Replacing dietary soybean meal with canola meal improves production and efficiency of lactating dairy cows. J. Dairy Sci. 98, 5672–5687, https://doi.org/10.3168/jds.2015-9563

Giallongo F., Oh J., Frederick T., Isenberg B., Kniffen D.M., Fabin R.A., Hristov A.N., 2015. Extruded soybean meal increased feed intake and milk production in dairy cows. J. Dairy Sci. 98, 6471–6485, https://doi.org/10.3168/jds.2015-9786

Lemosquet S., Delamaire E., Lapierre H., Blum J.W., Peyraudl J.L., 2009. Effects of glucose, propionic acid, and nonessential amino acids on glucose metabolism and milk yield in Holstein dairy cows. J. Dairy Sci. 92, 3244–3257, https://doi. org/10.3168/jds.2008-1610

Reid M., O’Donovan M., Murphy J.P., Fleming C., Kennedy E., Lewis E., 2015. The effect of high and low levels of supplementation on milk production, nitrogen utilization efficiency, and milk protein fractions in late-lactation dairy cows. J. Dairy Sci. 98, 5529–5544, https://doi.org/10.3168/jds.2014-9016

Rius A.G., McGilliard M.L., Umberger C.A., Hanigan M.D., 2010. Interactions of energy and predicted metabolizable protein in determining nitrogen efficiency in the lactating dairy cow. J. Dairy Sci. 93, 2034–2043, https://doi.org/10.3168/jds.2008-1777

Sova A.D., LeBlanc S.J., McBride B.W., DeVries T.J., 2014. Accuracy and precision of total mixed rations fed on commercial dairy farms. J. Dairy Sci. 97, 562–571, https://doi.org/10.3168/ jds.2013-6951

Weber C., Losand B., Tuchscherer A., Rehbock F., Blum E., Yang W., Bruckmaier R.M., Sanftleben P., Hammon H.M., 2015. Effects of dry period length on milk production, body condition, metabolites, and hepatic glucose metabolism in dairy cows. J. Dairy Sci. 98, 1772–1785, https://doi.org/10.3168/jds.2014-8598

Weiss W.P., 1998. Estimating the available energy content of feeds for dairy cattle. J. Dairy Sci. 81, 830–839, https://doi.org/10.3168/ jds.S0022-0302(98)75641-3