quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Diferentes níveis de energia fornecida para vacas em lactação afetam atributos físico-químicos do leite

Escrito por: Lisiane Garciaa

                  Vivian Fischerb

aAluna de mestrado do departamento de Pós Graduação em Zootecnia da UFRGS

bProfessora titular do Departamento de Zootecnia da UFRGS

 

A nutrição de vacas em lactação é um desafio para técnicos e produtores, tendo em vista que a categoria precisa ter suas exigências nutricionais atendidas para ter condições de lactar, ciclar para nova gestação, para a mantença e continuar se desenvolvendo, em caso de primíparas.  Há várias ferramentas que auxiliam o produtor a formular e balancear a dieta desses animais. As exigências energéticas podem ser expressos como a quantidade de nutrientes digestíveis totais (NDT), que ainda é amplamente utilizado, pois pode ser facilmente determinado por análise de alimentos (Weiss, 1998).

Níveis de energia distintos na dieta de vacas em lactação modificam os níveis de produção (Reid et al., 2015), composição química do leite (Sova et al., 2014), peso vivo e escore de condição corporal (Weber et al., 2015), entretanto não há muitos trabalhos que avaliem o efeito da redução dos níveis de energia da dieta de vacas em lactação na estabilidade do leite ao etanol. Então, com o objetivo de avaliar a mudança na produção e nas características físico-químicas do leite foram conduzidos 7 estudos, de 2004 e 2011, com parceria entre o grupo Pesquisa de gado leiteiro e comportamento animal (NUPLAC), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) e Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Foram avaliadas 132 vacas em diferentes estágios de lactação. Foram feitas 392 observações referentes aos diferentes níveis de consumo de energia por estes animais.

A Tabela 1 mostras informações sobre os sete diferentes testes de alimentação dados aos animais no período dos experimentos, a composição da dieta fornecida, a duração do experimento, o número e a raça dos animais utilizados, o peso vivo dos animais e a produção média diária de leite por vaca e o período de lactação.

Tabela 1: Características dos experimentos alimentares


Foram avaliadas as variáveis níveis de fornecimento de energia (% NDT da dieta), período de alimentação (número de dias), raça , produção diária de leite, gordura, proteína e teores de lactose, porcentagem de sólidos totais (ST), escore de células somáticas (SCS), acidez titulável e o teste de estabilidade ao etanol, tendo a maior concentração de etanol necessária para a coagulação da amostra de leite.

Não houve associação entre os componentes do leite com os níveis de energia, a porcentagem de etanol necessário para coagular o leite, o teor de lactose e a produção de leite.  Entretanto, os níveis de energia na dieta foram positivamente associados com produção de leite, estabilidade do leite e teor de lactose, como mostra a Figura 1.

Figura 1: Variáveis (nível de suplemento de energia, duração do experimento, produção de leite e características físico-químicas) projetadas no fator principal 1 e 2


As 392 observações foram agrupadas em 3 conjuntos de dados de acordo com a semelhança entre as observações. Os grupos  apresentavam 115, 135 e142 observações.  Esses 3 grupos são respectivamente referentes aos cluster 1, 2 e 3 da Figura 2.


Figura 2: Médias canônicas padronizadas de atributos produtivos e características físico-químicas do leite de vacas alimentadas com diferentes níveis de energia



Os fatores mais relevantes para agrupar as observações foram o nível de suprimento de energia, teor total de sólidos e acidez titulável de leite. Os atributos mais importantes que explicam a variação entre os grupos foram o nível de fornecimento energia, estabilidade do leite, produção de leite e contagem de células somáticas (SCS); gordura, lactose e teor total de sólidos; e duração dos ensaios, acidez e teor de proteínas para os clusters 1, 2 e3, respectivamente.  Isso se explica porque o aumento no suprimento de nutrientes via dieta resulta em maior disponibilidade de nutrientes para a glândula mamária, aumentando a produção leiteira (Lemosquet et al., 2009). De acordo com Giallongoet al. (2015), o aumento no suprimento de energia nem sempre afeta composição físico-química do leite, pois essa relação vai depender do nível de energia original, potencial produtivo da vaca, estágio de lactação e incremento líquido da energia fornecida (Benchaar et al., 2014; Boerman et al., 2015;Broderick et al., 2015).

A produção de leite diária aumentou com a suplementação de NDT. O leite apresentou maior estabilidade quando os níveis de NDT foram fornecidos em níveis médio e alto. Riuset al. (2010) relataram que um alto nível de energia suplementada como amido resulta em maior produção de leite e síntese proteica, atribuída ao aumento da secreção de insulina e fator de crescimento. Contudo, observou-se uma redução do teor de proteína do leite no grupo 3 mesmo com o maior aporte de NDT. Nesse caso,  pode ter havido o efeito de diluição da concentração de proteina devido ao aumento do volume de leite em 40%, bem como por uma proporção maior de vacas holandesas no grupo em comparação com a predominância de vacas Jersey dos grupos 1 e 2. O maior teor de gordura do leite observado no grupo 2 do que no grupo 3, pode ter resultado do maior uso de forragens, que por sua vez aumentou o teor de fibra da dieta.

O aumento do nível de energia fornecida às vacas leiteiras aumenta o volume de leite produzido, o teor de lactose e a estabilidade do leite no teste de etanol, mas não influencia outros compoenentes lácteos ou a saúde do úbere.

 

Artigo base

 

A.M. Gabbi; C.M. McManus; L.T. Marques; A.S. Abreu; S.C. Machado; M.B. Zanela; R.S. Barbosa and V. Fischer. (2018) Different levels of supplied energy for lactating cows affect physicochemical attributes of milk. Journal of Animal and Feed Sciences, 27, 11–17. DOI: https://doi.org/10.22358/jafs/83703/2018

 

Referências Bibliográficas

Benchaar C., McAllister T.A., Petit H.V., Chouinard P.Y., 2014. Whole flax seed and flax oil supplementation of dairy cows fed highforage or high-concentrate diets: Effects on digestion, ruminal fermentation characteristics, protozoal populations and milk fatty acid profile. Anim. Feed Sci. Technol. 198, 117–129, https://doi.org/10.1016/j.anifeedsci.2014.10.003

Boerman J.P., Potts S.B., VandeHaar M.J., Allen M.S., Lock A.L., 2015. Milk production responses to a change in dietary starch concentration vary by production level in dairy cattle. J. Dairy Sci. 98, 4698–4706, https://doi.org/10.3168/jds.2014-8999

Broderick G.A., Faciola A.P., Armentano L.E., 2015. Replacing dietary soybean meal with canola meal improves production and efficiency of lactating dairy cows. J. Dairy Sci. 98, 5672–5687, https://doi.org/10.3168/jds.2015-9563

Giallongo F., Oh J., Frederick T., Isenberg B., Kniffen D.M., Fabin R.A., Hristov A.N., 2015. Extruded soybean meal increased feed intake and milk production in dairy cows. J. Dairy Sci. 98, 6471–6485, https://doi.org/10.3168/jds.2015-9786

Lemosquet S., Delamaire E., Lapierre H., Blum J.W., Peyraudl J.L., 2009. Effects of glucose, propionic acid, and nonessential amino acids on glucose metabolism and milk yield in Holstein dairy cows. J. Dairy Sci. 92, 3244–3257, https://doi. org/10.3168/jds.2008-1610

Reid M., O’Donovan M., Murphy J.P., Fleming C., Kennedy E., Lewis E., 2015. The effect of high and low levels of supplementation on milk production, nitrogen utilization efficiency, and milk protein fractions in late-lactation dairy cows. J. Dairy Sci. 98, 5529–5544, https://doi.org/10.3168/jds.2014-9016

Rius A.G., McGilliard M.L., Umberger C.A., Hanigan M.D., 2010. Interactions of energy and predicted metabolizable protein in determining nitrogen efficiency in the lactating dairy cow. J. Dairy Sci. 93, 2034–2043, https://doi.org/10.3168/jds.2008-1777

Sova A.D., LeBlanc S.J., McBride B.W., DeVries T.J., 2014. Accuracy and precision of total mixed rations fed on commercial dairy farms. J. Dairy Sci. 97, 562–571, https://doi.org/10.3168/ jds.2013-6951

Weber C., Losand B., Tuchscherer A., Rehbock F., Blum E., Yang W., Bruckmaier R.M., Sanftleben P., Hammon H.M., 2015. Effects of dry period length on milk production, body condition, metabolites, and hepatic glucose metabolism in dairy cows. J. Dairy Sci. 98, 1772–1785, https://doi.org/10.3168/jds.2014-8598

Weiss W.P., 1998. Estimating the available energy content of feeds for dairy cattle. J. Dairy Sci. 81, 830–839, https://doi.org/10.3168/ jds.S0022-0302(98)75641-3


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